O QUE APRENDEMOS COM O II CONSAT
Refeito das emoções de um encontro emblemático, a nossa manifestação faz-se necessária menos pela perfeição da organização, da diversidade das ideias disseminadas ou a maturidade da abordagem de temas tão profundos e relevantes.
A rigor, a prática democrática só é possível com a negação do eu, com o desprezo da vaidade. Quando um grupo despido desses atributos se propõe a discutir um projeto de nação, tendo como ponto de partida a opressão, movem em seus túmulos os heróis que permitiram estarmos ali, naquele momento.
Ora, a opressão tanto pode ser inesperada como um terremoto, quanto congênita, como a que atinge os escravos filhos de escravos. Essa nada mais é do que um efeito do medo. Medo de perder o poder, medo de perder o capital, medo da morte. Têm medo os opressores.
Há até formulações cientificas para isso, como a de Ratzel, que afirma a necessidade do “Espaço Vital” para a expansão das sociedades – banalização da violência e a naturalização das guerras do imperialismo alemão -, formulações essas que dão origem a um câncer chamado corporativismo, síntese do medo travestido de força.
O poema cântico negro, do poeta português José Régio, afirma que corre em vossas veias o sangue velho dos avós, ou seja, o conluio dos oprimidos que oprimem a ação dos escravos filhos de escravos.
De fato, nenhum homem tem o dever de se dedicar à erradicação de qualquer mal, mesmo o maior dos males; ele pode muito bem ter outras preocupações que o mobilizem. Mas ele tem no mínimo a obrigação de lavar as mãos frente à questão e, no caso de não mais se ocupar dela, de não dar qualquer apoio prático à injustiça. Se me dedico a outras metas e considerações, preciso ao menos verificar se não estou fazendo isso à custa de alguém em cujos ombros esteja sentado. É preciso que eu saia de cima dele para que ele também possa estar livre para fazer as suas considerações. (Desobediência Civil Henry David Thoreau)
Assim negou o Sinffaz o caminho fácil, o sangue velho, a doença congênita. Surpresos, os opressores que alimentaram o labirinto – o nó górdio no nosso trabalho – descobriram que não tinham a espada de Alexandre e acordaram no pesadelo de Idi Amin em Entebe.
Se a injustiça é parte do inevitável atrito no funcionamento da máquina governamental, que seja assim: talvez ela acabe suavizando-se com o desgaste – certamente a máquina ficará desajustada. Se a injustiça for uma peça dotada de uma mola exclusiva – ou roldana, ou corda, ou manivela -, aí então talvez seja válido julgar se o remédio não será pior do que o mal; mas se ela for de tal natureza que exija que você seja o agente de uma injustiça para outros, digo, então, que se transgrida a lei. Faça da sua vida um contra atrito que pare a máquina. O que preciso fazer é cuidar para que de modo algum eu participe das misérias que condeno. (Desobediência Civil Henry David Thoreau)
Afinal, trabalhamos para viver ou vivemos para trabalhar? Que servidor, olhando para um túmulo, para um velho abandonado, para uma criança com fome, já se fez essa pergunta? O Sinffaz ensina: afasta-se o medo respeitando a consciência.
Parabéns.
Autor: Carlos Otávio Daruyche
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