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A CIDADE DE "AQUIFAZEMOS"

A CIDADE DE AQUIFAZEMOS
 
Naquele tempo, os aquifazemenses, povo da cidade de Aquifazemos, resolveram   editar uma lei para estabelecer a sinalização semafórica local. A lei foi sancionada pelo Prefeito, como não poderia deixar de ser, em razão da soberania do povo.
O povo, então, decidiu no art. 4o dessa Lei que as indicações luminosas dos semáforos seriam o parâmetro a ser observado pelos condutores dos veículos, para identificar os momentos de atravessar, ou não, os cruzamentos, visando evitar os reiterados acidentes ocorridos em Aquifazemos.  Desta forma, estas seriam as funções dessas indicações ou luzes, que teriam uma cor para cada.  Um decreto deveria regulamentar a posição das indicações luminosas de cada cor e o que cada uma dessas cores representaria. Esse decreto, contudo, jamais foi editado.
 A Lei previa também, em seu artigo 13, que os únicos atores dessa sinalização seriam três cores: verde, vermelha e amarela.
 Já em seu artigo 36, sem sequer entrar no mérito das funções das cores, a Lei prescrevia que o Controlador de Tráfego local deveria editar as especificações de cada indicação luminosa, em que cruzamentos seriam colocadas, quantidade de cruzamentos, tempo que ficaria acesa, posição, etc.
 Ignorando totalmente o artigo 4o, o controlador, sabe-se lá porque, decidiu, por meio de uma portaria, que apenas duas daquelas cores seriam utilizadas.  Optou pela vermelha e pela amarela. Entendeu ele que, se as duas estivessem apagadas, os motoristas poderiam atravessar os cruzamentos. Com isso, as indicações luminosas vermelha e amarela se julgaram as poderosas, passaram a ignorar as verdes e tomaram conta dos semáforos.
Ora, a genial idéia do controlador de tráfego durou um mês, um ano, dez, trinta anos. O poder adquirido pelas duas protagonistas foi tanto que impuseram a aprovação de uma sub-reptícia nova lei estabelecendo que os únicos atores da lei passariam a ser  elas, as indicação luminosas de cor vermelha e de cor amarela, defenestrando a verde.  Simples assim! A essa altura, para que duas? Uma só daria conta! Foi o que fizeram. Passaram a ser uma só cor.
 Foi como se nunca houvesse existido a antiga lei. Só a nova valia, apesar de recém-aprovada e… discutível.
 Depois de tanta reclamação, o todo-poderoso Subcontrolador de Tráfego, que também era uma indicação luminosa da cor unificada, ao ser questionado do motivo de se ignorar e não reconhecer o direito da cor verde, como quis o povo aquifazemense, produziu uma maravilhosa defesa do alijamento da cor verde, há muito desejada,  transcrevendo tudo que o sindicato daquelas cores reiteradamente reverbera e outras por justificativas do tipo, não sem antes se isentar de qualquer manifestação tendenciosa, sobretudo quanto à sua cor:
 – Ora, a indicação luminosa da cor verde que o povo quis, na verdade ela não pode ser parâmetro para a sinalização; nunca o foi. Eis que a sinalização envolve muito mais que isso que se pensa.
 – A sinalização  se divide em convencional e moderna e para tanto há que atender a requisitos mínimos, localização, ponto equidistante, estrutura de aço tubular, podendo ser na posição vertical, horizontal ou outra, senão não atende às necessidades da sociedade e contraria o código do meu trânsito;
– Atentem para o que preceitua o código do meu trânsito; vejam a impoluta recomendação do representante do Comitê Público, Dr. Bigodefeio, que ajudou a fundar o sindicato da nossa cor, que proíbe aproximar a cor verde das outras;
–  Tomamos por empréstimo a balizada informação técnica do ilustre engenheiro de iluminação Dr. É Çô Estandarte, para demonstrar a ignomínia que seria considerar que a cor verde poderia, também, ser uma indicação luminosa; 
– A indicação luminosa verde não tem iluminação e brilho adequados.  Aliás, já foi dito por ilustres engenheiros que ela nem pode ser considerada uma cor.
– Porém, adentrando ao mérito da questão, o artigo 36 da Lei, ao prever especificações, permitiu ao controlador de tráfego editar a portaria que vige há muito anos definindo a verde e amarela como cores  e não se tem notícia que a verde seja uma cor. Repito, nunca foi!
Assim, o todo-poderoso subcontralador de tráfego, no melhor estilo “L’Etat, c’est moi”, sentenciou: com a presente exposição de motivos encerro, peremptoriamente, qualquer discussão nesse sentido no âmbito da Divisão de Controladoria do Tráfego.  Ponto final, não se fala mais nisso!  Se quiserem uma cor, recorram a Justiça porque no que se refere à cor, não existe palavra que se sobreponha à minha, nem mesmo a do Prefeito. Para mim só existe a cor resultante das cores vermelha e amarela.
Ah!, a vontade do povo? Ah!, o povo e a cor verde que se …
 
Comenta-se que o Povo instituiu a lei primeira, prevendo as três cores, nos idos de 1975. Para consolidar interesses de classe, com a imposição dos representantes das cores vermelha e amarela, foi alterada, à sorrelfa, tal lei, em 2005.
 
 

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