Artigo | Bons velhos tempos

Folheando o Volume II da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, do ano de 2008, saboreio-me com o inteligente texto do Prof. Gy Reis Gomes Brito, cujo Patrono no nosso Instituto é Urbino Vianna, sobre fatos jornalísticos marcantes sobre a nossa cidade. Gy Reis aqui cresceu, estudou, se graduou e pós-graduou e tive a alegria de ser seu colega de JUC (Jovens Unidos a Coordenação do Pe. Dudu e do Pe. Luiz César). Alguns textos do seu longo artigo são de uma musicalidade e de uma poesia de fazer gosto a quem lê, e reflete sobre o que se lê. Se não vejamos: “Sendo assim, “tempos de Antes”, se remete há tempos bons, como o da segurança propriedade, das estações favoráveis, colheitas,  intimidade protetora de um grupo social fechado, de uma ordem, de um tipo de civilização(…). Muitas vezes nos deparamos com variadas referências do passado, mesmo sem tê-los vivido, mas seu poder evocador é a busca de um modelo, de um arquétipo, pois a necessidade fora do tempo dar-lhe um valor a mais de exemplaridade. O tempo de Antes nos parece frequentemente oposto à imagem de um presente sentido e descrito  como um momento de tristeza e de decadência, ergue-se o absoluto de um passado de plenitude e de luz. Resultado quase inevitável: cristalizando ao seu redor todos os impulsos, todos os poderes do sonho, a representação do “tempo de antes” tornou-se mito.

Como um pintor que aos poucos vai construindo a sua obra, Gy Reis nos remete a Montes Claros do passado com rara maestria e muita “similitude” do pouco que também vivi e que muitos que nos leem viveram. Os jovens do JUC, do GENC (Catedral) hoje transformados em EAC (Encontro de Adolescentes com Cristo). E continua a nos encantar o Professor: “Não pretendemos evocar um tempo tão distante; das auroras, do primeiro sol, das primeiras manhãs montesclarenses, mas alguns ‘bons velhos tempos’. Os tempos dos velhos carros de boi a cantarolar pelos becos e ruas numa magia de encantos; tempo das carroças e carrocinhas do leite a buzinar, anunciando a chegada, assanhando à garotada do lugar, que a noite mal dormiam, e ficavam em vigília, à espera do novo dia, para em seguida ouvir a buzina da carrocinha do leite; tempos do velho mercado na Praça Dr. Carlos, onde aos sábados os comerciantes vendiam, trocavam os produtos hortifrutigranjeiros que vinham da roça; também era o lugar ideal de encontro dos amigos para trocas de palavras; palavras amigas, palavras alegres e às vezes tristes; ali era aos sábados o pulmão da pequena cidade, onde feirantes e comerciantes negociavam seus produtos; ali era o cantinho dos mascates, alfaiates, vendeiros, barbeiros, professores, médicos, fazendeiros, donas-de-casa e até o bispo de vida atribulada”.

“Era também o tempo da Praça da Matriz, com suas missas aos domingos de manhã na Igreja de Nossa Senhora da Conceição e  São  José;  as procissões do Senhor morto, os grupos de jovens cristãos, os grupos de oração, as confrarias e os vicentinos. Tempos de dom João Antônio Pimenta, D. José Alves Trindade, Pe. Dudu, Pe. Janjão, Pe. Oswaido, Pe. João Fio, Pe. Joaquim e Pe. Tadeu. Era o tempo do coreto da Matriz com seus pássaros a gorjear; os idosos na Praça evocando ainda mais outros tempos, tempos inauditos”.

Gy Reis encerra seu Artigo com uma feliz referência ao escritor Raoul Girardet nestes termos, que considero mais que atual, vez que atravessamos a pior e mais mortal Pandemia da nossa história contemporânea – observem que atualidade: “Por isso (…) tornou-se necessário, não apenas dialogar ou citar alguns autores; mas foi preciso fazer uma conexão com a ‘idade de ouro’ de Raoul Girardet, constituindo assim em uma importante referência, para narrarmos os ‘bons velhos tempos’ montesclarense.”

O tempo de hoje é o tempo do medo e da Pandemia. É o tempo do individualismo. É o tempo das disputas insanas.  É o tempo de degradação, de crise. Crise econômica e social, onde os valores individuais subordinam o coletivo. Onde parasitas esquecem valores universais para ganhar cada vez mais. Tempo de hoje são retratados nos outdoors, jornais, TV e nas ruas, como o tempo de insegurança e incertezas; violência em todos os níveis.

Para enfrentar uma Pandemia de dimensão planetária nada como deseja a “idade de Ouro” desenhada por Girardet.  Tempo de valores resgatados, como da inocência, pureza, amizade, solidariedade, comunhão, nossas mais distantes origens, diante dos costumes corrompidos deste tempo, recuperar a festa, como comunhão social, fusão dos espíritos, dos corações apaixonados. Segundo Giradert, a festa  enquanto comunhão social está intimamente confundida com uma outra aspiração, de forte exigência,  que é a da SEGURANÇA, edificação do modelo de comunidade, sempre protetora, acolhedora  e com um sonho de permanência.

Gustavo Mameluque

Jornalista, Servidor Público Estadual e Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Especialista em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro-BH.
gustavomameluque@gmail.com

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