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Fiscal de Tributos Estaduais condenado com a penalidade administrativa de repreensão

Número do processo:

1.0000.00.148037-5/000(1)
 

Relator:

JOSÉ BRANDÃO RESENDE

Relator do Acordão:

JOSÉ BRANDÃO RESENDE

Data do acordão:

25/04/2000

Data da publicação:

28/04/2000

Inteiro Teor:

 

EMENTA: VOTO VENCIDO – ADMINISTRATIVO – PENALIDADE – ANULAÇÃO – AUSÊNCIA DA INTENÇÃO DE PREJUDICAR – RESSARCIMENTO DE DANO MORAL INDEVIDO.
Deve ser anulado o ato administrativo que aplicava penalidade a funcionário, se o mesmo se conduziu dentro da legalidade no exercício de suas atribuições, não decorrendo, no entanto, da anulação desse ato a obrigação de o Estado indenizá-lo por danos morais, se não identificada na sindicância, que culminou com a aplicação da penalidade de repreensão, outro propósito dos sindicantes que não o de investigar os fatos e sugerir a penalidade.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 000.148.037-5/00 – COMARCA DE ALÉM PARAÍBA – APELANTE(S): JOSÉ AUGUSTO LAMEIRA – APELADO(S): ESTADO DE MINAS GERAIS – RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL, VENCIDO, EM PARTE, O RELATOR.
Belo Horizonte, 25 de abril de 2000.
DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE – Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O julgamento deste feito foi adiado na sessão do dia 21/03/00, a pedido do Relator, após sustentação oral.
Com a palavra o Sr. Des. José Brandão de Resende.
O SR. DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE:
VOTO
Cuida-se de ação anulatória de ato administrativo de advertência funcional, cumulada com pedido de perdas e danos, ajuizada por José Augusto Lameira, Agente Fiscal de Tributos, contra o Estado (Secretaria de Estado da Fazenda).
O autor foi punido na esfera administrativa como co-responsável, junto com dois outros colegas, pelo fato da não apreensão de nota fiscal com prazo de validade vencido.
A sentença não acolheu os pedidos do autor, que, inconformado, apela a este Tribunal, alegando que a decisão de 1º grau baseou-se principalmente nas informações dos sindicantes, sem levar em conta o teor dos autos e que a resposta do Estado limitou-se a preliminares processuais sem enfrentar o verdadeiro mérito da ação.
Com efeito, refutando os fundamentos da sentença e reiterando os termos da petição de ingresso e do parecer ministerial de fls. 65/72-TJ, o autor apelante pede o provimento do recurso, para que se julguem procedentes os pedidos da ação.
À douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso.
Conheço da apelação.
Entendeu a MMª Juíza da sentença, confirmando as conclusões da Sindicância Administrativa (autos em apenso), que o autor apelante tinha o dever de anotar na nota fiscal nº 335804 sua invalidade para acobertar o transporte de gado bovino, evitando assim o uso da mesma, principalmente por estar no exercício de cargo de chefia.
Ressaltou ainda que, a despeito de os sindicantes terem afirmado ser o autor pouco humilde, pretensioso e interessado em se promover, não foi essa a motivação da penalidade, mas “a inobservância do dever funcional, qual seja, evitar que o contribuinte fizesse uso da Nota Fiscal invalidada.”
Li atentamente os autos, as peças da Sindicância Administrativa, inclusive, e não consegui extrair o envolvimento culposo do ora apelante nos fatos ali apurados.
Primeiro, porque ele não poderia ter retido a controversa nota fiscal, mesmo ciente de que a mesma perdera a validade para o transporte do gado, por tratar-se de documento de múltiplo interesse (contábil, fiscal e comercial) para o produtor emitente.
Segundo, porque inexistente qualquer prescrição de ordem legal ou funcional que o obrigasse a intervir nesse documento, registrando sua invalidade, quando formalmente a legislação já o fizera, ao retirar-lhe a eficácia por decurso de prazo.
Na verdade, o que se confirma, expressamente, dos autos da sindicância e da presente ação (fls. 43 e 76 do apenso e 59 do principal), é que o apelante, cioso da invalidade da NF, tomou as providências necessárias à sua interceptação, caso fosse utilizada para o transporte do gado.
Nessas circunstâncias, ao indiciar e punir o recorrente como co-responsável nas faltas praticadas pelos dois colegas, a comissão sindicante agiu, a meu sentir, com excesso de zelo e julgamento por atribuir-lhe dever não previsto legalmente, igualando, assim, a sua iniciativa, correta, de denunciar o fato aos superiores à conduta inequivocamente faltosa dos outros funcionários envolvidos.
Ademais, as faltas cometidas pelos outros dois funcionários punidos são, em si, autônomas e imputáveis exclusivamente a cada um deles, não ensejando a presunção de responsabilidade do apelante na ocorrência das mesmas, simplesmente por não ter invalidado a NF, iniciativa a que não estava obrigado.
Com efeito, não configurada ilegalidade na conduta do apelante nem ofensa ao art. 216, VI, da Lei nº 869/52, é de se declarar nulo o Ato nº 479, de 03.10.91, do Diretor da Superintendência de Recursos Humanos da Secretaria de Estado da Fazenda.
Quanto ao pedido indenizatório por danos morais, entendo que a Sindicância Administrativa enfeixada nos autos em apenso, ao avaliar a conduta legal do apelante (fls. 80), afirmou em juízo subjetivo tratar-se de “funcionário ativo, competente, atualizado, convicto de suas obrigações (…)”, para a seguir, na conclusão em que recomendava a penalidade de repreensão, reconhecer que não houve dolo ou má-fé nos atos praticados por nenhum dos envolvidos, que não auferiram benefícios e que eram primários.
Ora, vê-se pelo desfecho da sindicância, que esta, a despeito da punição reconheceu no apelante qualidades que definem o perfil do funcionário exemplar e atenuantes essenciais para os seus atos nos acontecimentos ali narrados.
Importa destacar que os demais atributos aplicados ao apelante, ou seja, de pouca humildade, de pretensioso e interessado em se promover, embora de cunho negativo e como censura, numa análise que deveria primar pela objetividade, não lhe servem, a rigor, como afronta infamante, vez que ninguém está obrigado a comportar-se como humilde e despretensioso.
A ninguém se deve julgar pela humildade e despretensão, mas pelo desrespeito que demonstra à opinião e ao direito de seus semelhantes. Até porque, também a ambição pessoal ou profissional merece reprovação e é condenável quando invade o território da opinião e dos direitos alheios.
Fora dessa exacerbação, que os sindicantes entenderam de censurar, o comportamento dito pretensioso chega a ser o almejado, porquanto a humildade e despretensão, quando falsas, indicam mais a tibieza de caráter, que, mesmo não ofendendo opinião ou direito dos demais, não emolduram nenhuma conduta profissional desejável e meritória.
Por essa evidência, mesmo reprovando a subjetividade da avaliação, entendo que a repreensão não enxovalhou o conceito profissional do apelante, tanto mais que a sindicância concluiu pela ausência de dolo ou má-fé na sua conduta sob exame.
Noutro enfoque, mas ainda pelas razões acima, não vislumbro no julgamento inquinado – sem embargo da carga de subjetividade – a intenção de prejudicar o apelante e de denegrir sua imagem funcional, quando, repito, para apontar-lhe os defeitos da falta de humildade, da pretensiosidade e jactância, reconhece nele atributos funcionais que emolduram o perfil do profissional ideal, ou seja, “ativo, competente, atualizado e convicto de suas obrigações.”
Entendo, por isso, que na hipótese não ficou demonstrado qualquer aspecto intencional dos sindicantes em denegrir a imagem do ora apelante, mas apenas o de cumprir o encargo que lhes foi confiado.
O fato de para ele ter sido recomendada também a pena da repreensão há de ser entendido como derivado de uma incorreta avaliação das provas e da extensão dos efeitos do art. 216, VI, da Lei nº 869/52.
Não há, portanto, dano moral a indenizar.
À vista do exposto, dou provimento parcial à apelação para anular o ato nº 479, de 03.10.91, do Diretor da Superintendência de Recursos Humanos da Secretaria da Fazenda, que aplicou ao apelante a penalidade de repreensão, negando, porém, a pretendida indenização por dano moral, tal como requerido na petição de ingresso.
Custas pelas partes, meio a meio, respondendo cada uma pelos honorários dos respectivos patronos.
O SR. DES. PÁRIS PEIXOTO PENA:
VOTO
Li os autos com redobrado cuidado, especialmente porque se contrapunham decisão do 1º grau e voto do relator. Lá, deu- se por improcedente o pedido para considerar válida e devida a punição do autor. Cá, dá-se provimento parcial ao recurso, por entender o ilustre relator inocorrente a falta funcional que se tributa ao apelante, mas nega-lhe a indenização que pretende, a título de composição do dano moral.
Tal decisão – e isso está enfaticamente destacado no voto – não tivera o efeito danificador que lhe atribui o apelante, pois que, salvo a referência à sua arrogância e pretensiosidade, a conclusão do Sindicante acabou sendo-lhe lisonjeira, quando a ele se referiu como “funcionário ativo, competente e atualizado, convicto de suas obrigações”, além de não ter reconhecido a ocorrência de dolo ou má-fé nos atos praticados por nenhum dos envolvidos.
Faço leitura diferente, entretanto, do quadro. De fato, os primeiros elogios não dizem respeito a caráter ou conduta moral. Ser funcionário ativo, competente, atualizado é elogio à intelectividade. Ser convicto de suas obrigações significa ter conhecimento pleno de suas obrigações, não que as cumpra.
De outro lado, o fato da admissão da inexistência de dolo ou má-fé apenas serve para graduar a falta. Até porque, se declaradas ocorrentes tais circunstâncias, a punição não poderia exaurir-se na repreensão, por óbvio. Fato é que foi punido. Se não agiu com dolo ou má-fé, de outro lado afirmou-se, via da punição, que foi relapso e descumpridor dos deveres.
Pois bem. Como entendo tanto quanto o douto relator que na verdade as provas não satisfizeram à demonstração de qualquer culpa do apelante, (e aí, especialmente, reporto-me às razões da douta Procuradoria-Geral de Justiça), também sou pela procedência do pedido. Não apenas para anular o ato 479 de 03.10.91, mas também para reconhecer ao autor o direito à indenização por dano moral.
O dano moral houve. E aqui falo de o moral e não da moral.
Ora, sempre que a alguém se impõe um sofrimento, responde-se não apenas pelos danos morais daí resultantes, mas também pela dor moral conseqüente.
Dizer-se que a punição, ainda que em termos de repreensão ou advertência, não ocasiona sofrimento, dor moral, é substimar o amor próprio das pessoas.
Se o próprio Estado, através de seus órgãos próprios, reconhece a correção dos atos do seu funcionário, ressalta- lhe as qualidades e o pune indevidamente, deve responder pelo mal que injustamente causa.
Neste caso, anulado o ato, reconhecido pelo Estado tratar-se o apelante de funcionário competente, deve ser compelido a indenizá-lo pelo mal que lhe causara.
Assim, dando provimento ao apelo, dou pela procedência do pedido inicial apenas limitando o valor da indenização a cem (100) salários mínimos.
Invertam-se os ônus sucumbenciais, na proporção.
O SR. DES. ORLANDO CARVALHO:
VOTO
Peço vênia ao Eminente Desembargador Relator para acompanhar o voto do Eminente Desembargador Revisor. Ao se entender que o funcionário sofreu o vexame de um procedimento administrativo sem causa há de se lhe pagar a indenização pelo dano moral evidentemente sofrido.
SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL, VENCIDO, EM PARTE, O RELATOR.
 
Fonte: TJMG, 28 de abril de 2000.

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